sexta-feira, 12 de novembro de 2010

NEM A MORTE




Musica das coisas suando em minha pele,
na noite humanizada da pele, o anjo cego,
o sol caolho, musica, musica de todos
os desesperos, de todas as azuis diabruras
e terríveis cósmicas gangrenas,  o silencio
de estrela, o branco tenso da cicatriz,
não quero enxugar o suor do morto,
não quero nunca mais sofrer a lenta
corrosão na cama cheia
de farelos de câncer, oh jovem voz
antiga em corpo roído, pobre musica
das coisas ditas sem resultado.
Não quero pintar o lábio da morta.
Vestir a nudez de ausência, dependurar
os brincos de lágrima, não quero o sal
amargo de crianças sangrando no fundo
palco de um teatro mais negro que a negra
composição de musica navegando sem braços.
Porquanto persigo a musica que não sei.
Pois sei tão pouco, três ou quatro poetas,
pedaços de sistemas filosóficos, restos de
programas televisados, poeira dos sonhos
nunca lembrados, um radio na infância
e esta musica a me esculpir no vago.
Nem sei o cantor capaz de espantar
o bicho, ele me espia do corredor,
sorrio para ele, somos um. O vento
soca a porta, minha mulher ressona,
o homem é a extrema estrela desesperada,
estou calmo,
não é preciso fazer nada, nem a morte. – (A/D)



10 comentários:

  1. É de tirar o fôlego do princípio ao fim, uma senhora poesia é de tirar o chapéu e agradecer com a alma de joelhos....

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  2. E como tirar a poeira dos sonhos sem remover junto o sonho do sonho, que a poeira é de certa forma o que o desperta?
    Adorei o seu post. Vou pensar mais sobre ele.
    bjs

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  3. "Porquanto persigo a musica que não sei.
    Pois sei tão pouco, três ou quatro poetas,
    pedaços de sistemas filosóficos"...

    Visceralmente poético.
    De doer! De chorar!
    De ler.

    bj
    Rossana

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  4. Intensidade do começo ao fim. Lindo! ;)

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  5. intenso e soturno...

    peguei o selinho, distribui, e tem outro pra vc lá.
    beijo!

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  6. Poema lido num respiro só... só fico babando aqui, né? rs
    Beijo, querido...

    PS.:Ontem eu estava mais inspirada para comentar, mas o pc não colaborou... e a noite foi barra. rs
    ;*

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  7. De Rubem Alves:"Adélia Prado disse: "Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra". Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema."
    Pois então o poeta não sabe, não sabemos nós tampouco, ele vê, canta e transforma o sentir em palavras. É assim. Talvez seja assim. Grande abraço.

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  8. O relógio ali do lado é lindooooooo!
    É roxo!!

    \o/

    beijo melado!

    (hihihi)

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  9. nem precisa sangrar a lente pra esta visão doer nos dentes...

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